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A PESTE
Primeiramente quero salientar que qualquer semelhança com a vida real é
mera coincidência.
Caro leitor, perturbe-se com essa leitura e tome o
cuidado ao lê-la em voz alta (se for o caso) para que não haja crianças por
perto, apesar “delas” aparecerem no conto. Se você for um adepto às histórias
de terror, é muito provável que irá
gostar desta, mas adianto que não se trata de assombração, mesmo que seja um tanto assombroso. Agora, se
preferir os contos de causos este também
se encaixa muito bem, mas se procuras um romântico ou um politicamente correto nem se atreva a começar.
Se por acaso, você caro leitor (a) tiver medo de
agulhas ou não as suportar, sugiro que lance mão de ler este ocorrido, afinal,
eu estou certo de que haverá picadas.
E se ainda houver quaisquer dúvida, eu afirmo que se
trata de um conto de TERROR.
I
Segurava com as duas mãos um grande pedaço de carne.
Sua esposa observava sentada a sua frente, mexia-se muito colocando a língua
para fora e pedindo para o marido continuar e dar o que ela tanto queria.
Por ora a carne ainda é de procedência desconhecida,
pelo seu aspecto tudo indica que se trata de carne de porco. A brincadeira
adulta de ambos aumentava e parecia não ser a primeira vez. Ele é um homem de
aproximadamente cinqüenta e três, barriga bem saliente e peluda, suas nádegas
parecem ter sido achatadas na parte superior e suas costas tinham um aspecto
nojento devido os pelos molhados pelo suor. Seu quadril balançava num vai e vem
e seus olhos viravam-se animalescamente. Os gemidos começaram discretamente,
mas já tomavam conta de toda a situação. Gemidos esses que vinham de ambas as
bocas.
Estavam na cozinha, ela sentada e ele em pé
esfregava-se no pedaço de carne sobre a mesa. Não era uma cozinha pequena, mas
não se pode dizer que era grande. Defronte a , estava a porta de madeira
envernizada. Ao lado esquerdo, a geladeira num tom azul muito claro e sobre ela
um pequeno aparelho de televisão e DVD. A suas costas, estava a janela e ao pé
dela, uma média pia de granito cheia de pratos e copos sujos. O armário
localizava-se do outro lado da cozinha e as paredes eram de um branco creme.
_ Está chegando! Está chegando!
_ Isso! Continua meu amor! Continua meu bode
safado... – Disse ela com as pernas abertas esfregando os dedos nos seus
lábios.
Escutava-se o barulho feito por tal ato: um barulho
molhado muito parecido com plástico ou quando alguém fica brincando com a boca
e os dedos chupando a saliva cuspida na mão.
A mesa balançava muito e o ferro fazia um excitante
gemido. Com os dedos ainda um pouco sujos de sangue da carne e sêmen, ele
começou a passá-los no corpo da esposa que por sua vez, segurava a mão do
marido e fazia força para que os dedos dele não ficassem apenas na superfície.
O filho mais velho do casal era adotado e entrou na
cozinha. Foi direto pegar, na geladeira, alguma coisa para beber. Sua presença
não causou desconforto e nem susto em seus pais que continuaram. O rapaz de
aproximadamente dezessete anos passou por detrás do pai, olhou para o pedaço de
carne rosada suja esbranquiçadamente. Olhou para os olhos da mãe que o
observava abrindo e fechando a boca e olhou os dedos do pai passeando pelo
corpo da mãe. Abriu a geladeira pegou uma lata de refrigerante e deu um gole.
Ficou parado observando tudo.
Ao perceber que seu filho não ficaria apenas na
observação, mesmo que apenas no mundo dele (do adolescente), deu ordem com voz
áspera para que saísse. A voz daquele homem era de um rouco que provavelmente
aos gritos deveria causar estrondos ou simplesmente não fazer barulho algum.
Seu olhar para o filho adotivo foi como duas laminas e sua voz arranhou todo o
ritual que logo foi iniciado de onde havia sido brevemente interrompido.
Depois de terminado o momento fraternal daquele belo
casal, a carne foi colocada em um recipiente de plástico e levada à geladeira,
no mesmo estado em que o chefe daquela adorada família havia deixado.
Etezile, a rainha do castelo, dirigiu-se até o quarto
de suas filhas – duas graciosas meninas, uma de treze anos e outra de sete,
ambas também adotadas – e pediu para a mais nova lavar a louça.
Mais tarde, para o jantar, houve arroz, purê de
batata e bife frito com médias rodelas de cebola levemente murchadas no óleo
quente. Havia também salada de alface lisa temperada com sal, vinagre e azeite.
Do prato, subia o vapor do arroz e feijão quentes e frescos. Quase ao centro da
mesa estava uma forma sobre um apoio de madeira onde havia algumas coxas de
frango tentadoramente douradas e que pareciam piscar de vez em vez com o calor
do recipiente.
Salis, o imperador, chamou as crianças para jantar.
Gil, o filho mais velho já estava sentando à mesa. Samanta, 13 e a Cristina de
7 chegaram após terem lavado as mãos no lavatório do banheiro. Chegaram
correndo e rindo. A mais nova vestia um vestido branco de renda com pequenos
detalhes azuis, seus cabelos longos e louros estavam amarrados rabo de cavalo.
Tinha os olhos castanhos e um nítido desvio. A mais velha de cabelo resultado
da mistura de ondulado e pixaim, tinha a pela do pecado – um claro moreno
dourado. Vestia uma espécie de camiseta justa cuja manga chegava uns dois dedos
antes dos cotovelos. Estava despropositadamente sexy. Tinha um corpo magro e
seus seios joviais eram proporcionais e estavam delicadamente desenhados pela
camiseta preta.
A refeição foi iniciada logo após o grande monólogo
protagonizado pelo imperador que agradeceu e fez os coadjuvantes agradecerem
também pela mesa farta, bonita e deliciosa. Logo depois, pegou os dois
controles remotos que estavam sobre a mesa ao lado do seu prato e direcionou à
TV e ao DVD. Era um filme pornográfico e seu áudio estava muito baixo.
O bife que outrora fora instrumento de prazer para
Salis agora era servido para que toda a família pudesse alimentar-se. Depois de
frito não foi possível ver qualquer coisa que denunciasse a substância que fora
literalmente jorrada sobre a carne. Igual as três primeiras personagens, as
duas meninas não sentiram cheiro, ou paladar diferente. A rainha gemeu quando
mordeu um pequeno pedaço, sentia prazer, desse que sentimos quando degustamos
um doce divinamente maravilhoso.
II
O cheiro de frango assado percorreu o estreito
corredor daquela residência, desceu as escadas que esticavam os degraus até um
cômodo que lembra muito um porão. Escuro absoluto. Aquele aroma quente, que
denunciava casa cheia e pessoas bem vindas, perdeu-se ao cheiro que pairava
naquela alcova.
Um odor forte e agudo azedava o ambiente e irritava
os olhos de uma moça que acabara de acordar com uma forte dor de cabeça. O
escuro encheu seus olhos de pavor e o cheiro de urina e fezes encheu sua narina
de dor. Ela percebeu também que havia um cheiro insuportável de porco e chegou
a escutar gruídos, mas achou tudo absurdo e não reparou o que talvez pudesse
ser um animal perdido naquela infinitude finita. O chão estava gelado, assim
como também estava a parede onde colocou a mão e sentiu algo molhado e
escorregadio.
Preferiu intensamente não ter acordado. Eram
absolutamente insuportáveis o cheiro e a escuridão daquele lugar. O frio e os
barulhos eram verdadeiras lanças enferrujadas que penetravam a carne daquela
moça acorrentada pelas pernas e amarrada pelas mãos. Depois de tentar entender
o presente que o dia havia guardado, seu segundo instinto foi gritar o máximo
que podia. Gritar também não foi tão fácil como ela pensou que seria – o cheiro
arranhava sua voz e adentrava os pulmões causando uma sensação de dor e cansaço
no peito. No entanto, chorou, copiosamente chorou como quem já teve os olhos
ofuscados pelo futuro.
Mais uma vez escutou o gruído e esteve certa de que
não estava sozinha e logo imaginou que se tratava de um chiqueiro. Escutou
também passos de chinelos mal pisados que pareciam aproximar-se. Um barulho
muito familiar ao gruído, como quem puxa o catarro para então cuspi-lo,
denunciou ser a chegada de um homem.
À medida da chegada dos passos para mais perto, a
respiração daquela moça parecia se distanciar e ficar mais difícil. Estava
ofegante, mas sua falta de oxigênio era causada pelo pânico. A mesma sensação
causada em momentos de adrenalina ou dos momentos em que precisamos fazer algo
muito importante e que há muitas pessoas observando, mas a sensação acontecia
da forma em seu avesso, tomava conta do estomago daquela criatura perdida na
escuridão.
A chave rodou a tranca e a porta foi aberta. Uma luz
amarelada ao tom de laranja iluminou as proximidades da entrada do cômodo.
Levou questão de segundos para que as lâmpadas fossem acesas. Ela estava
sentada ao lado oposto da porta. Tentou esconder os olhos da luz e teve uma
expressão estranha ao ver o que a rodeava. Ela era uma moça bonita, de pele
branca queimada pelo sol, teria aproximadamente vinte e sete anos, seus cabelos
negros e ondulados desciam até os ombros, os olhos deveriam ser castanhos
escuros.
As paredes eram cobertas por azulejos de um cinza
muito claro, os limbos estava verdadeiramente sujos. O chão era de um piso da
cor azul também muito claro e muito sujo com borrões marrons que lembravam
fezes. A sua direita, estava um porco rosado muito grande e gordo amarrado pelo
pescoço com correntes. Suas patas pisoteavam uma lama cinzenta misturada à
urina e fezes e naquele exato momento o animal defecava.
A sua frente, alguns centímetros para a esquerda,
estava em pé o imperador. Tinha uma bandeja em uma das mãos e na outra uma
pequena garrafa com água. Cuspiu no chão o que havia puxado segundos antes e
andou em direção reta. Agachou-se defronte para aquela pobre coitada e pousou
sobre o chão a garrafa d’água e o pequeno recipiente que trazia. Nele havia
restos de comida da janta: arroz, feijão, ossos do frango, alguns até com um
pouco de carne e ainda tinha o que parecia ração para cachorro.
Ela não tirava os olhos assustados daquele senhor que
a observava com olhos de lâminas da luxaria. Ficou de pé novamente e foi até o
lado direito dela, bem próximo ao seu rosto. Abriu o zíper e começou a sonhar,
imaginar, fantasiar e tornar real na medida do possível, depois de
aproximadamente cinco minutos, ela percebeu o que era aquela coisa molhada onde
ela havia colocado a mão logo que acordou. Aquele cheiro peculiar daquela
substância embrulhou seu estomago, vomitou. Tentou virar para a esquerda, mas
ainda sim sujou um pouco suas roupas e o recipiente com o pão de cada dia
trazido por Salis.
Ele passou seus dedos ainda sujos no resto dela,
sorriu e com uma expressão de prazer puxou seus cabelos de forma bruta e
balançou sua cabeça pelos cabelos – dois pra lá e dois pra cá. Ela gritava,
chorava e com suas mãos amarradas tentava segurar as mãos dele, que eram um
pouco maiores, firmes e rudes, na tentativa de que os puxões doessem menos.
_ Papai... papai! – Chamou a caçula. Tinha um ar de
inocência e sua voz de criança angelical demonstrava que nada do que acontecia
dentro daquela casa estava errado. Talvez não estivesse mesmo dentro da cultura
daquela adorada e respeitada família. Aquela doce garota de sete anos olhou
para aquela moça sentada e amarrada como um animal e viu que seu pai terminava
de levantar suas calças, abotoar e fechar o zíper. A expressão daquela
acorrentada infeliz foi de paz e certa esperança por ver aquela criança e ao
mesmo tempo sentia pavor e repudia ao ver o quanto semelhante era o anjo e o
demônio.
_ Fala minha princesa! No que o papai pode te ajudar?
Ela olhou para a moça e com uma postura envergonhada
falou baixo ao pai, quase um cochicho. Ele, ao ouvi-la, deu uma gargalha e
beijou sua bochecha dizendo que não havia nenhum problema em colocá-la para
dormir.
Antes de desligar as luzes e subir as escadas, ele
deu uma última olhada para a hóspede, seu olhar foi ameaçador e parecia dizer
que reservava surpresas. Com a feição séria, segurou seus órgãos genitais e com
firmeza fez um movimento de exibição.
Antes era a treva, e o anfitrião trouxe a luz e com o
seu poder a levou. Maria – esse era o nome dela – estava novamente rodeada pela
treva.
III
Lá embaixo, naquela verdadeira alcova, Maria perdeu
todo o sentido de horário e talvez em sua cabeça, fosse noite ainda ou seria
para sempre. Cochilou um pouco ou acha que chegou a fechar os olhos para não
ver a escuridão que a cercava.
Acordou ou abriu os olhos naquele fundo de odor
quando escutou a porta ser aberta. Aquela luz amarelada iluminou novamente as
proximidades da escada e ela pode ver um belo rapaz. Vestia uma camisa social
de tecido trabalhado na cor de um verde muito claro quase amarelo e uma calça
preta muito bem passada. Era o filho mais velho. Acendeu a luz do cômodo,
depositou sobre uns dos degraus alguma coisa que Maria não pode identificar,
mas achou que talvez fosse algum livro.
Ele se aproximou, olhava sempre no rosto dela,
carregava um leve sorriso carismático e trazia nas mãos alguns pedaços de fio
elétrico e um pano. Chegou muito próximo de seu rosto. Ela virou para a
esquerda. Percebeu que ele estava muito perfumado, seus sapatos impecavelmente
engraxados e a fivela prateada do seu cinto muito bem polida.
Segurou sua cabeça com as duas mãos e a esfregou em
sua virilha. Maria tentou se afastar, mas quase tudo o que tentasse fazer seria
em vão. Para
sorte de Gil, ele também sabia que seria quase tudo inútil. Com a tira de pano,
amordaçou-a e logo em seguida tirou os sapatos, as meias, a calça e por fim a
cueca. Vestia uma cueca branca. Foi em direção ao porco com os pedaços de fio
elétrico. O animal assustou-se um pouco, mas logo teve suas patas traseiras e o
focinho amarrados. Voltou e pegou um preservativo no bolso da calça.
Maria não acreditava no que estava vendo e quando o
porco começou a berrar, seus gruídos dolorosos promoveram nela, uma sensação de
dor e nojo. Virou o rosto para direção oposta, enquanto Gil, no seu doce
balanço, depositava no animal toda sua confiança.
Com tudo terminado, Gil vestiu sua cueca – segurava-a
pelas pontas dos dedos – tomou o cuidado quando a colocava de modo que seus pés
sujos não se encostassem à vestimenta de baixo (em vão). Foi a única peça que
vestiu. Segurou o resto de sua roupa e demonstrando pressa dirigiu-se à escada,
pegou o objeto anteriormente depositado em um dos degraus e subiu correndo.
Maria olhou em direção ao porco que continuava muito
inquieto e percebeu que sangrava. Em poucos minutos, o animal deitou na lama
que o cercava, apoiou o rosto em suas patas e ficou a respirar. Talvez, fosse
aquele o único momento de solidariedade, que aquele que acompanhava Maria,
chegasse a dividir e demonstrar.
Cerca de vinte minutos depois, Gil estava de volta,
com a mesma roupa que chegara momentos antes. Trazia agora uma bota branca de
plástico. Calçou-a e foi retirar do porco os arames que havia colocado.
Desamordaçou Maria. Ela chegou a perceber certa preocupação por parte dele.
Teve quase certeza de que ele estava ali, às escondidas. Levou os fios com ele.
Subiu a escada, passou pela porta e ouviu-se o trancamento. Segundos depois, a
porta foi aberta novamente. Desceu a escada, desligou a luz, subiu novamente e
dessa vez não se esqueceu de deixar a treva naquele lugar.
Aquela adorada família estava de saída. Iam todos à
igreja. Estavam muito bem vestidos. Salis usava um belo terno azul marinho e
sua esposa um vestido da cor do vinho. As meninas também usavam vestidos. A
mais nova, um branco com detalhes rosa, um sapato com o salto levemente alto da
cor creme. A mais velha, um branco com rendas e detalhes roxo, seus sapatos
eram mais altos. Nenhuma das mulheres pareciam maquiadas. Um cheiro suave de
rosas tomava conta do espaço.
Aquele que impera naquela casa, tem tudo a sua
percepção e nada ou quase nada tende e fugir de seu conhecimento. Viu quando
Gil trancava a porta que dava para a escada que levava até a escuridão onde
Maria estava presa, à espera de uma luz que não fosse a que a fazia despertar
do ou para o seu pesadelo.
_ O que você estava fazendo lá embaixo?
_ Nada...
_ Como nada?! Por que está... deixe me ver. – Salis
verificou se seu filho estava abrindo ou fechando a porta. Onde você pegou
essas chaves? Quem te deu permissão?
Pareceu ficar mais irritado quando viu o que Gil
tentava esconder: os fios elétricos e a tira de pano. Não esperou. Deu um
tabefe na nuca de seu filho adotivo que entregou as chaves na mão de seu pai
enquanto encolhia o pescoço igual uma tartaruga.
A porta foi aberta novamente e dessa vez, Maria
estranhou a força da chave que fez um barulho de quem está com raiva ou pressa.
Salis desceu a escada com pisadas fortes. Acendeu a luz e foi direto para
Maria. Sua expressão era de fúria e certo temor. Puxou Maria pelas pernas com
força. Abriu sua calça e abaixou-a até metade da perna. Assustada, gritava e
tentava se esquivar. Ele passou os dedos em seu corpo, olhou como se seus dedos
pudessem estar sujos, cheirou-os e não satisfeito, abaixou-se e cheirou de
perto. O medo estava pintado e tatuado no rosto de Maria. Ela não tirava seus
olhos de Salis e por uma fração de segundos, ela olhou para o porco. Ele fez o
mesmo e demonstrou alívio ao ver que seu filho não havia feito nada contra sua
hóspede, que já estava com a voz a sumir de cansaço. Antes de desligar a luz e
voltar para a parte de cima da casa, Salis, educadamente, subiu a calça de
Maria e olhou mais vez o animal.
Na escuridão, que agora passava a ser uma companheira
e um refúgio, Maria escutou, sem identificar exatamente, gritos e o que parecia
ser Gil chorando.
IV
O escuro ajudava os olhos ficarem pesados. Cochilos
já eram quase freqüentes. Dormiria melhor se não fosse o mau cheiro da própria
urina e fezes em suas roupas. Seu corpo também doía muito, suas costas e suas
nádegas pareciam moídas. Deitou-se de rosto para o teto, escuro absoluto.
Sentiu um alívio, mas logo o incomodo das dores voltou a fazer companhia.
Virou-se de barriga para baixo. Já não sentia mais odor que pudesse fazer algum
mal e sem perceber, gemeu quando pode descansar.
Talvez fosse noite e no meio dela, Maria acordou. Ainda
sonolenta, percebeu que sentia frio e que babava e encolhendo-se apoiou, sobre
as duas mãos, a cabeça e em segundos, para sua paz, fechou os olhos para ver
luzes.
Não sabe se dormiu muito ou se o tempo foi muito
curto, mas quando abriu os olhos encontrou uma mulher toda vestida de látex.
Estava deitada com os cotovelos em um lençol branco sobre o chão, suas pernas
flexionadas. Assustada, Maria sentou-se e não tirou os olhos daquela mulher.
Era a rainha, Etezile sorriu para sua hóspede. Esta percebeu que aquela passava
sua mão direita pelo seu corpo de forma pecaminosa. Levantou-se um pouco e
ficou em quadrúpede.
Sua roupa de látex tinha um zíper que estava aberto e
percorria o caminho desde as suas nádegas até sua virilha. Era possível ver
muitos detalhes.
Em questão de poucos minutos, o imperador descia as
escadas e vestia uma roupa similar. Estava comicamente pervertido. Sua barriga
saliente, suas nádegas desproporcionais. Vestia também uma mascara feita do
mesmo produto que a roupa. Tinha perfurações apenas na região dos olhos, da
boca e claro, na cintura. Ele aproximou-se de sua esposa que continuava na
mesma posição que ficou para detalhar à Maria. Etezile teve seus cabelos
puxados e teve também colocada uma mascara igual ao do marido. A única
diferença entre as mascaras era que a dela possuía um instrumento que forçava a
boca ficar aberta o tempo todo. Eram agora dois bonecos.
Mais uma brincadeira adulta tomou conta daquele
espaço. Ele jogou no rosto dela a sua salvação e antes que ela jogasse a dela
na boca dele, pegou uma pequena faca escondida sob o lençol e foi até Maria.
Ele sempre atrás dela, sem tirar seus dedos do corpo da esposa. Maria teve sua
camisa rasgada e o mamilo do seio esquerdo foi cortado. Quanto mais ela gritava
de dor, a rainha gemia mais alto enquanto o marido usava sua língua. O choro e
os gritos de Maria juntaram-se ao pavor causado pelo sangue que escorria pelo
seu corpo. Etezile não aquentou muito e depositou no rosto de seu marido a
salvação e na eternidade daqueles segundos, as forças de suas pernas foram-se
junta à salvação antes jorrada. Sentou-se no colo de Maria. Ao retornar dos
segundos eternos, retirou a máscara, estava muito molhada, já que momentos
antes, babou muito devido às brincadeiras com seu marido. Passou suas mãos
sobre o rosto de Maria que ainda chorava e parecia estar muito cansada. Beijou
sua testa em um gesto solene e cochichou:
_ Não tema criança, você não está sozinha. A solução
para suas aflições será provida!
Mais uma vez, Maria se rendeu ao choro.
_ Shiii... Calma meu anjo. Nós te amamos – e com o
dedo indicador esquerdo levantado para o alto, continuou – e Ele também.
Neste instante, Maria simplesmente desabou sobre suas
forças, lembranças, coragens e o amor que talvez tivesse por si mesma. Nada
mais seria como antes, nada mais seria paz e sereno. Seu peito doeu muito,
tanto que achou que teria um ataque. Um frio encheu seu estômago, suas vísceras
queimaram e junto a elas um vazio subiu a sua garganta. Suas mandíbulas
travaram-se e sua mente inundou-se nos mais pretos vermelhos cinzas pensamentos
que já teve. Com a cabeça ainda baixa, virou apenas os olhos em direção aos de
Etezile que se assustou um pouco e ao mesmo tempo sentiu prazer em ver aquele
olhar odioso.
_ Ela está quase pronta...
_ Eu já estou... – disse Salis baixando-se e
novamente passando os dedos em sua esposa.
Num movimento robótico, Maria abriu suas pernas, mas
continuou de cabeça baixa. Salis entendeu como um convite e foi sua esposa que
tirou a calça da hóspede. Etezile tinha um sorriso no rosto e Salis mordia os
lábios observando o corpo de sua esposa e, agora, o da convidada. Maria ficou
de pernas flexionadas e abertas enquanto Salis deitou de barriga para cima. Sua
esposa ficou de cuidar dele enquanto ele cuidava de Maria. Três gemidos e o do
meio sempre abafado, Maria retorcia-se, seu cabelos caídos ondulavam-se sobre
seu rosto e Etezile parecia pular. Desta vez, Salis sentiu a salvação de Maria
e trocou, mais uma vez, sua salvação com a da esposa.
Depois de terminado, Maria recebeu um forte tabefe de
Etezile cuja boca pronunciava adjetivos relacionados a valores morais. Foi ele
quem vestiu Maria novamente.
Salis e Etezile já estavam quase trocados quando a
filha mais nova desceu correndo pela escada. Usava um uniforme escolar:
camiseta branca de manga curta onde havia uma listra azul escuro e detalhes
vermelhos, uma calça moletom também azul escuro com detalhes vermelhos e um
tênis branco. Desceu a escada perguntando pelo pai e pela mãe. Encontrou-os
quando ele ainda levantava sua calça e ela terminava de vestir uma pequena
camiseta regata cor de rosa.
Curiosa a menina perguntou o que estavam fazendo.
_ Estamos libertando uma alma minha querida.
_ Ah bom. Por que não me esperaram, eu gostaria de
ver.
Pai e mãe entreolharam-se e riram.
_ Há coisas que são melhores quando não vemos. –
Disse o pai.
_ Mas o satanás ainda ronda ela?
_ Talvez querida, agora é hora de comer. Vamos, vou
preparar um lanche bem gostoso para você. Cadê seus irmãos?
_ Gil foi pro quarto e Samanta foi ver se a senhora
estava na cozinha.
_ Eu também quero esse lanchinho, amor. Estou com uma
fome. – Disse Salis num tom muito amigável, pacífico e um pouco irônico.
Cristina deu outra olhada para Maria e questionou por
que ela estaria suja. Por que o peito dela sangrava. Seu pai disse que para
trazer o bem às pessoas é preciso fazer certos sacrifícios e que é preciso
saber aceitá-los para que possam sempre estar perto de Deus. E ficaram de dar
banho a ela mais tarde, depois do lanche.
Ao ver as roupas de látex e o lençol branco nas mãos
de sua mãe, a garota mais uma vez questionou o porquê daquelas roupas e de quem
eram. Seu pai respondeu:
_ Muitas perguntas em garotinha... Sabia
que quem pergunta demais acaba expulso do paraíso?
_ Sério? Mas por quê?
_ Ora, mais uma vez outra pergunta... É melhor irmos
porque estou morto de fome.
_ Por que as luzes ficam desligadas? Ela não tem medo
de ficar no escuro, mamãe?
_ Minha adorada, esqueceu o que seu pai acabou de te
dizer?
_ O quê?
_ Sobre quem faz muitas perguntas... Só saiba que
quem tem fé não tem porque ter medo.
Antes que tudo ficasse em pleno escuro e subissem as
escadas, Maria observava Cristina que, pela última vez, a olhou e exibiu com um
pequeno sorriso, desses que não sabemos o que tem por de trás. Maria teve a
sensação de que não podia confiar nela e aquele sorriso deu lugar a uma
expressão forte de pedra e raiva.
V
No caminho para a cozinha, encontraram Samanta que
chegava para ver o que faziam e sobre o que conversavam. Riam todos e o
imperador mostrava amor pela sua rainha com beijos na bochecha e abraços
discretos. Um lar de amor e paz. Uma família de respeito e de santificações. Um
homem, uma mulher e amor resultam em família.
Para o lanche, foi feito café e chá. Etezile
esquentou também um pouco de leite em uma caneca de alumínio muito bem areada.
Sobre a pia de mármore estava o bule, subia o vapor do coador de pano. O cheiro
de café fresco tomava conta do espaço. Para comer, tinha pão de forma
branquinho e muito macio. Quase se podia dizer que ele estava úmido, mas não de
modo que prejudicava o seu paladar, era justamente o oposto. Havia também
biscoitos de maisena e pão de sal amanhecido que ficavam, no entanto, ótimos
com manteiga e rapidamente aquecidos no micro-ondas.
Samanta abriu a geladeira e dela retirou o pote de
manteiga e o colocou sobre a mesa que, segundo antes, Christina forrou com uma
toalha de mesa cheia de detalhes quadriculados no tom vermelho, laranja,
amarelo e branco. Gil chegou rindo e dizendo que foi chamado pelo cheiro bom do
café recém passado. Samanta ainda colocou sobre a mesa, um pequeno pires com
açúcar, copos e mais uma vez, abriu a geladeira e retirou dela, fatias de
queijo embrulhadas em plástico e papel branco.
Salis ligou o aparelho televiso e o DVD. Não havia
áudio. E talvez fosse melhor mesmo que não houvesse naquele momento. Estavam
todos sentados em volta da mesa e comiam enquanto na tela do televisor eram
exibidas cenas pornográficas de uma loira e três rapazes malhados. Tal fato não
causava nenhum tipo de constrangimento a nenhum integrando daquela adorada e
honrada família.
Já era quase três da tarde quando resolveram dar um
banho em Maria.
Desceram o imperador e a rainha. Encontraram a oriunda
desacordada e muito pálida. Etezile colocou sua mão direita sobre a testa de
Maria e percebeu que estava com febre.
_ Talvez seja por causa do ferimento.
_ É, talvez... Precisamos cuidar disso. Tadinha
dela...
Maria foi acordada e se assustou quando abriu os
olhos e viu aqueles dois seres em sua frente. Provavelmente, naquele momento,
as suas faces eram verdadeiros monstros para ela. Já não podemos deduzir se
quando dormia chegava a sonhar com o sol ou se o escuro daquela alcova já havia
apagado a lembrança do arrepio causado pelo calor dos raios solares.
Levantaram-na e com as pernas e as mãos amarradas,
Maria foi colocada em pé, quase pendurada por um enorme prego na parede que foi
percebido pela hospede somente naquele instante. Tiraram suas roupas e agora
ela parecia tremer mais. Talvez tremesse de frio ou por não saber ao certo que
tomaria banho. Água fria da mangueira. Havia sabonete e Etezile trouxe um pote
de xampu. Tanto Salis quanto sua esposa passavam as mãos no corpo de Maria,
faziam de forma rude e direta como quem esfrega, até de forma mais delicada
como quem acaricia. Maria sabia que estava sendo acariciada, afinal, todos nós
sabemos ou sentimos que há algo a mais no toque de alguém.
No momento que Salis retirava Maria do prego e a
colocava no chão, suas duas filhas chegaram dizendo que havia visitas. Eram
visitas muito próximas de Salis e Etezile, já que atuavam na mesma área. As
meninas viram o corpo nu de Maria, mas não demonstraram qualquer reação. A elas
foi pedido que ficassem lá embaixo e que cuidassem de secar aquela moça. Foi
ordenado também por Etezile que depois de seca, fizessem nela um curativo.
Não demorou mais que dez minutos, Gil chegou chamando
pela Samanta. Esta respondeu que estava ocupada e que havia visitas na casa e
era preciso tomar muito cuidado. Após ele descer as escadas e ver as partes do
corpo de Maria à mostra, Samanta, sua irmã adotiva, percebeu nos olhos do irmão
a tentação. Estavam as duas agachadas e após ver as reações do irmão, a mais
velha levantou-se e abraçou Gil por trás passando a mão esquerda em sua
virilha. Ria e dizia qualquer coisa. Ele riu e também passou os dedos no corpo
da irmã. Cochicharam-se e foram juntos para parte superior da casa.
Não sei dizer, caro leitor, o que passou pela cabeça
da menina menor. Não puder notar nenhuma manifestação dela em relação aos seus
irmãos adotivos. O que posso dizer é que ela apenas os olhou e no momento em
que eles começaram a subir as escadas, depois se virou para Maria presa pelas
mãos e pernas e terminou de fazer o curativo.
Talvez por um descuido, Cristina desamarrou as pernas
de Maria para que pudesse colocar sua calça. Esta parecia uma fera pronta para
o bote, muito provavelmente estava apenas esperando o momento certo e seu
raciocínio estava atento a qualquer movimento descuidado da garota. Com as duas
pernas deu um forte empurrão em Cristina que como boneca de pano foi jogada a
certa distância. A garotinha ainda deslizou um pouco com as costas no chão no
azulejo. De fato foi uma pancada forte e dera com a cabeça no chão, e talvez
essa força da pancada tenha assustado-a um pouco, porque logo depois de perceber
que havia sido arremessada, começou a chorar. De início chorou apenas, mas
segundo depois começou a berrar e não se levantou.
Tudo aconteceu muito rápido. Nos momentos em que é
preciso fazer algo que envolve muita adrenalina, geralmente, os fatos acontecem
em segundos, mas que depois de narrados fazem o leitor/ouvinte ter a impressão
de levados vários minutos.
Maria já estava em pé e realmente parecia uma fera
descontrolada. Queria loucamente sair daquele lugar. Foi impreterivelmente em
direção da garota que começava a levantar-se com a boca aberta e em prantos. Chutou
seu rosto como se esquecesse de que estava lutando com uma criança ou o que
parecia ser uma; quebrou o nariz. Cristina ficou caída no chão aos gritos,
chorava e seu nariz começara a sangrar, seu choro era abafado pelas próprias
mãos sujas de sangue.
VI
Maria, de algum modo, conseguiu soltar também suas
mãos. A vontade de fugir e adrenalina inundaram seu ser que não percebera que
ainda estava nua. Já no topo da escada, encontrou a porta entre aberta já que a
deixaram aberta pelo fato de Cristina ter continuado lá embaixo. Cuidou em
olhar se sua fuga, naquele momento, não a denunciasse.
Saiu... Do seu lado esquerdo vinham risos e dizeres
altos, estavam o donos da casa e as visitas na sala, que ficava ao lado oposto
da cozinha. Em sua direção, Maria viu que um homem alto e magro de costas,
vestido de um terno marrom, parecia segurar um copo e levava-o à boca. Ele
soltou um riso alto, o que a assustou. Ela também deu as costas para o homem e
seguiu para a cozinha. Maria não sabia para onde estava indo, mas sempre em
momentos de perigo, o nosso instinto parece dizer mais alto.
Tentava andar o mais rápido e silenciosamente
possível, sempre de olho aos redores como um rato dentro de casa a procura de
comida. Encontrou Etezile, sua cunhada e uma amiga muito próxima, amiga da
igreja. Todas se assustaram... Etezile paralisou-se em frente à pia com um copo
em mãos, sua cunhada olhava para cada uma das mulheres como quem procura
respostas ou o primeiro movimento para então se movimentar também.
A amiga foi logo em direção de Maria com os braços
atirados para frente, carregava uma expressão de pena e com uma voz doce,
dessas que usam para dirigirem-se às crianças, questionou o que estava
acontecendo e se estava bem. Não houve tempo para que ela pudesse chegar perto
de Maria. Foi empurrada bruscamente.
_ Socorro! Socorro! – Gritou Etezile.
Os homens, na sala, correram em direção à cozinha.
Eram quatro no total.
A mulher empurrada levantava-se com dificuldade
quando Maria, desesperada, tentava passar por Etezile e sua cunhada. A faca que
estava no escorredor ajudou no momento de fuga. Os homens quase pegaram Maria,
mas já estava do lado de fora da casa e logo atrás iam gritando: a rainha do
castelo e a irmã do imperador. Esta com um corte na mão e aquela com uma pequena
perfuração no ombro.
Maria não sabia onde estava, mas de certo não estava
em uma rua qualquer. Olhou ao redor e viu casas de auto padrão. A rua cujo
asfalto parecia novo, ardia sob a luz do sol.
Na cozinha ainda, a mulher, que fora derrubada, ligou
para os seguranças da portaria e informou que havia uma jovem nua,
descontrolada e armada correndo pelo condomínio. Na escada de frente para a
sala, desciam apressados Gil e Samanta. Pareciam estar arrumando as roupas como
se tivessem tirado-as minutos antes. Deram de encontro com Cristina que subia
do porão com as mãos na boca, chorava muito ainda e estava ensangüentada; não
quebrara apenas o nariz, alguns dentes também.
Não demorou muito para que o carro da escolta
apanhasse a fugitiva. Naquela altura dos acontecimentos, não havia mais jeito a
não ser que a polícia resolvesse o caso.
Colocaram um vestido todo florido em Maria e a
levaram para a delegacia. Os seguranças contaram ao delegado que receberam uma
ligação de uma das moradoras sobre aquela mulher maluca. Antes que os moradores
e seus amigos dessem seus depoimentos, Maria foi a primeira a ser questionada
pelas autoridades. Ela disse que já estava presa, em cárcere privado, há alguns
dias, talvez semanas, e que fora, todos os dias, abusada, molestada e agredida.
Contou com detalhes a respeito daquela família.
No terceiro dia, todos os envolvidos no caso foram
chamados para dar os depoimentos. O primeiro foi Salis:
_ Delegado, essa mulher é doida, invadiu a minha
casa, machucou minha filha caçula adotiva por quem tenho tanto amor, machucou
minha esposa com uma faca e ainda agrediu minhas visitas. Eu não faço ideia
como ela entrou na minha casa e nem porque estava nua. Provavelmente é uma
pervertida depravada.
No quinto dia, todos já haviam dado os depoimentos e
todos os agredidos fizeram exame corpo de delito. Como Salis é um homem
conhecido por protagonizar ensinamentos religiosos em TVs abertas, anúncios
publicitários entre outros, o caso tornou-se público e a população teve acesso
à história contada pela mídia. Cristina chegou a falar com o delegado e também
afirmou nunca ter visto Maria antes; ninguém duvidaria de uma criança.
Opiniões dividiam-se e a cada testemunho, parecia
mais absurda a versão de Maria. Pessoas nas ruas discutiam entre si quem estava
falando a verdade, mas sempre a verdade, vista pelos os outros, caiam sobre a
face de Salis. Como poderia um homem como ele fazer tamanho absurdo? Abusar com
a esposa de uma mulher e ainda usar seus filhos adotivos? Entre eles uma
educada menina de sete anos?
A perturbação varia de acordo com cada pessoa. Não é
condenável salientar que Maria pudesse estar um pouco desorientada devido ao
que viveu. No entanto, como não sabiam ou não viam até onde ia a linha da
verdade dela, o resultado do seu exame psicológico ajudou-a, o menos pior que poderia
acontecer, a não ser presa em uma prisão qualquer. Os profissionais
responsáveis pela identificação mental de Maria não conseguiam ligar sexo,
látex, porco, estupro animal, criança, demônio, peito, faca, escuridão, ração
de cachorro, restos de comida, presa, porão entre outras coisas.
Depois de descobrir-se louca, Maria agora se
perturbava questionando se a linha do seu imaginário foi ultrapassada ou se o
inferno existe mesmo.
No sétimo dia, Maria foi condenada por atentado
violento ao pudor, difamação, agressão física, tentativa de homicídio, falso
testemunho e agressão a menor de idade. A população sentia-se agora mais certa
do que dizer. Com todas as informações passadas, tanto pela mídia quanto pelo
próprio imperador, acreditavam que tudo não passava de uma história criada pela
imaginação perturbada de Maria, mas que sua loucura não podia servir de
desculpa para não pagar o que devia.
Como tentativa de encerrar o assunto ou fazer com que
as pessoas não quisessem mais tirar suas dúvidas, Salis usou a mídia para
acalmar as especulações:
_ Caros irmãos e irmãs, nestes tempos de provação, é
preciso estar atentos ao demônio porque ele ronda nossos lares. Não se esqueçam
de que o diabo é astuto e ele usará várias formas para nos corromper, ele pode
usar a imagem de uma criança, de um senhor de idade, de uma louca. A peste anda
sobre a Terra e ela até tentará, em sua audácia, confundir-vos dizendo que o
demônio veio em forma do Bem.
Samir S. Souza
Publicado no Recanto das Letras em 28/10/2011.
Código do Texto: T3302942
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